Como bem definiram por aí: Argentina, 1985 é o filme sobre Ditadura Militar que o Brasil, infelizmente, não pode fazer. O longa assinado pelo diretor Santiago Mitre narra o histórico julgamento que puniu diversos comandantes do regime militar argentino devido aos crimes atrozes que praticaram contra a humanidade, tais quais prisões arbitrárias, sequestros, torturas, privação ilegítima de liberdade e homicídios de opositores à Ditadura Militar, dentre outras barbáries, partindo do argumento de que os que estavam contra o regime eram inimigos perigosos do país, ainda que não possuíssem nenhuma espécie de poder bélico para enfrentar os militares. O que, por sua vez, resultou em uma guerra desigual e injusta em que os vis torturadores lançaram mão de todo o poder do exército para oprimir e violar civis indefesos.
Responsáveis por diversos desaparecimentos que seguiam sem solução, os nove líderes das três primeiras juntas militares, que governaram o país no pós-golpe de Estado de 1976, tiveram de sentar no banco dos réus e serem julgados em um tribunal civil. Coube ao promotor público Julio Strassera (Ricardo Darín) e ao jovem promotor adjunto, Luis Moreno Ocampo (Juan Pedro Lanzani), investigar a ditadura militar mais sangrenta da história da Argentina e condenar seus criminosos.
Com uma fluência narrativa exemplar, o filme foge do conceito chatíssimo de filmes de tribunal hollywoodianos, optando pela montagem mais dinâmica, intercalando cenas do julgamento (repletas de depoimentos dolorosos de vítimas), com a vida familiar de Strassera e passagens centradas na jovem equipe liderada por ele, encarando o desafio de se meter com o poderio militar. Mais interessante ainda é o fato de não romantizar esse período histórico (partindo para um manjado fundo musical solene, por exemplo) e jamais mitificar a figura de Strassera, não se esquivando de citar sua inércia e omissão durante o período ditatorial. Ainda assim, seu discurso de condenação é de se aplaudir de pé. Termos a representação das Mães de Maio é outro dos momentos que impacta sem precisar de muitos artifícios narrativos.
O espetacular Ricardo Darín encabeça um elenco primoroso. Por vezes, enquanto assistimos ao longa, é inevitável nos passar pela cabeça o pensamento: como seria bom se o Brasil tivesse seguindo o exemplo dos hermanos argentinos e condenado à prisão perpétua seus próprios Masseras e Videlas, além de cancelar suas patentes. Porém, ao invés de condenar Ustra e outros torturadores e assassinos, o Brasil estava mais ocupado elegendo um presidente que os exaltava. Ah, que inveja dos hermanos…
O longa é distribuído pelo Prime Video e pode ser conferido por assinantes do serviço de streaming.
Andrizy Bento