Ted Lasso

E quem poderia imaginar que uma comédia dramática sobre um time de futebol inglês combalido seria tão atraente e cativante? Vencedora de sete prêmios Emmy, incluindo melhor série de comédia, Ted Lasso, disponível na Apple TV, acaba de finalizar sua segunda temporada e é a atual queridinha da crítica.

Ted Lasso é um técnico de futebol americano curiosamente contratado para treinar o time  inglês de futebol (ou, como os americanos denominam, soccer) AFC Richmond. A equipe vem em constante declínio, perdendo importantes partidas e sem saber como virar o jogo para driblar as constantes derrotas. Lasso chega com seu jeito espirituoso e otimista e, a princípio sofre a rejeição do clube e da torcida. Aos poucos, lançando mão de pequenos gestos, recupera a autoestima da equipe e alcança resultados surpreendentes para um time que há muito não sabia o que era uma vitória e treinado por um técnico que entende muito pouco ou quase nada do esporte em questão.

No entanto, a gerente do clube, Rebecca Welton, contrata Lasso – inexperiente no campo do futebol tradicional – justamente para sabotar o AFC Richmond, como um meio de vingança pessoal ao ex-marido, Rupert Mannion. No processo de divórcio, Rebecca acaba por assumir o controle do clube e, a princípio, seu plano é destruí-lo, pois o time era tudo o que importava para Rupert durante os anos em que permaneceram casados. O sabor amargo da humilhação ainda está fresco em sua boca devido a todos os episódios de traição protagonizados pelo ex-marido, amplamente noticiados pela mídia. Rebecca ainda guarda cicatrizes de um casamento abusivo pautado pela passivo-agressividade do ex. O que ela não contava é que fosse se afeiçoar a Lasso e à nova rotina proveniente das mudanças no clube. E aos biscoitos que ele traz toda manhã e deposita gentilmente em sua mesa.

Amparada por um elenco fenomenal, encabeçado pelo ótimo Jason Sudeikis que vive o personagem-título, a série produzida por Bill Lawrence, Joe Kelly, Brendan Hunt e pelo próprio Sudeikis, é inspirada em um personagem homônimo que o ator interpretou pela primeira vez em uma série de anúncios publicitários para a cobertura da NBC Sports da Premier League. O cast ainda conta com Hannah Waddingham no papel de Rebecca e Brett Goldstein como Roy Kent. Todos os três devida e justamente  premiados por suas performances no Emmy deste ano.

Explorando a dinâmica entre os jogadores do time, todos com personalidades únicas e díspares entre si, bem como os contrastes entre os americanos e ingleses, um dos maiores méritos da produção, sem dúvida, é a galeria de personagens inspirados, bem construídos e extremamente humanos, com os quais é possível se identificar independente do cenário e do contexto em que estão inseridos.

Além do alegre e otimista Lasso e da chefe linha dura que disfarça suas fraquezas e inseguranças com um verniz de frieza, Rebecca, temos o esquentado Roy Kent, o arrogante James Tartt (Phil Dunster), a espevitada Keeley (Juno Temple), o ranzinza Beard (Brendan Hunt), o submisso Higgins (Jeremy Swift), o outsider Nate (Nick Mohammed) e o adorável Sam (Toheeb Jimoh). Contudo, as características destacadas aqui tratam-se, em sua maioria, de primeiras impressões superficiais. Os personagens vão muito além desses traços mais marcantes de personalidades que se sobressaem em um primeiro momento, apresentando camadas capazes de surpreender o espectador ao longo dos episódios.

O melhor de tudo é que Ted Lasso foge com impressionante habilidade do discurso edificante e motivacional. O que o protagonista diz aos coadjuvantes que gravitam em torno dele, são linhas honestas. O próprio Ted escapa da figura caricata que é o arquétipo do mentor, se mostrando humano, tentando manter em segredo que está enfrentando uma crise conjugal e atravessando colossais meltdowns, cada vez mais frequentes. A luta do personagem em desacreditar e recusar a terapia, a princípio, é tão realista e “close to home”, que é difícil não se colocar no lugar dele. O texto é afiado e inteligente, munido de gags espertas e de um humor até espontâneo. 

Além dos méritos narrativos, a produção acerta também em questões estéticas. A paleta cromática destaca as tonalidades de azul e vermelho desde a abertura (as cores da camisa do clube). Falando em abertura, o tema interpretado por Marcus Mumford & Tom Hove é memorável. Periga você se pegar cantarolando o dia inteiro após assistir a um único episódio da série. A deliciosa trilha sonora ainda traz grandes nomes da música britânica como Oasis, Blur, Elastica, Radiohead e David Bowie

Ted Lasso é aquela produção que conquista aos poucos, assim como o próprio protagonista que, gradativamente, angaria o respeito e a simpatia de sua chefe e da equipe que treina. Porém, quando você se dá conta, já está tão envolvido pela narrativa como Rebecca está atraída e apaixonada pela receita primorosa de biscoitos de Ted. Uma trama simples que versa sobre o cotidiano, combinando drama e comédia, e capaz de levar às risadas e às lágrimas em um mesmo episódio e com a mesma intensidade. 

A série estreou em 14 de agosto de 2020 e teve o último episódio da segunda temporada disponibilizado no streaming da Apple no último dia 8 de outubro. A primeira temporada é composta de 10 episódios e a segunda, de 12. A duração varia entre 30 e 56 minutos para cada capítulo. Uma dica? Vale a maratona.

Andrizy Bento

Uma consideração sobre “Ted Lasso”

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