O explosivo Baby Driver abre com uma eletrizante e surreal sequência de perseguição em uma autoestrada embalada pelos acordes de “Bellbottoms” do Jon Spencer Blues Explosion Logo após, em um elegante plano-sequência, Baby caminha de maneira coreografada pelas ruas como se fosse um personagem egresso de um musical clássico. Ao adentrar um café, temos uma panorâmica. Assim que avista a garota que povoa seus sonhos, Baby perde ligeiramente o compasso, erra no tom, vacila no equilíbrio.
Discos de vinil, velhas fitas cassete, gravadores e flashs de filmes como Os Batutinhas, Monstros S/A e Clube da Luta no televisor do protagonista, compõem o repertório de Baby e legitimam a construção de um personagem fascinante e de uma atmosfera deliciosamente retrô. As cores vibrantes dos cenários só vem perpetuar essa aura. A câmera, sempre em movimento, faz questão de valorizar o ambiente ao redor e a interação dos personagens com o espaço que os rodeia. A música é constante; com seus fones de ouvido sempre a postos, Baby parece se sentir parte de um eterno videoclipe. Os diálogos ágeis evocam um gangsta hip hop furioso e a montagem acelerada confere o dinamismo que a narrativa demanda.
Assinado pelo estiloso cineasta Edgard Wright, o longa tem como base um videoclipe dirigido pelo próprio, “Blue Song” do Mint Royale, de 2003. Baby Driver soa como o trabalho de sua vida, a obra que Wright sempre buscou realizar como diretor, só precisava de um orçamento melhor. Daí o resultado apaixonado que fez deste um dos títulos mais atraentes do ano passado.
O promissor Ansel Argot, de Kingsman: Serviço Secreto, interpreta o personagem com o incomum nome Baby. Um problema de audição adquirido durante um acidente automobilístico envolvendo seus pais na infância, faz com que ele ouça um constante zumbido. Para aplacar o incômodo, ele passa a vida ouvindo música em seus fones de ouvido, especializando-se em leitura labial. Se envolve no mundo do crime sem querer, ainda garoto, ao cruzar com Doc, personagem de Kevin Spacey – em uma clara alusão a De Volta Para o Futuro.
Ágil, o protagonista trabalha para ele como o motorista em assaltos cuidadosamente planejados e executados. Baby conduz automóveis de maneira inacreditável, fazendo verdadeiros malabarismos na estrada. Acreditando que está prestes a pagar sua dívida e abandonar a vida de crime, começa a se relacionar romanticamente com a garçonete Debby (Lily James, carismática e competente como de costume) e arranja um trabalho como entregador de pizzas, graças ao seu pai adotivo – deficiente auditivo e paraplégico – Joseph (CJ Jones). Porém, seus planos de seguir um caminho pacato são frustrados quando Doc reaparece lhe pedindo um novo favor e Baby se depara com os métodos violentos de Bats (Jamie Foxx).
Baby Driver é composto de inúmeros momentos e personagens memoráveis. Destaque para o divertido diálogo na lanchonete entre Debora e Baby, em que eles mencionam a quantidade imensurável de músicas que existem sobre Marys e as poucas que trazem o nome Debby em suas letras. O que me fez lembrar que não existe nenhuma com meu nome… Além disso, é um exercício delicioso pescar as diversas referências à cultura pop espalhadas pela narrativa. Ecos de outros filmes que envolvem motoristas taciturnos são notórios na linguagem corporal e na essência do protagonista, os quais nos remetem ao personagem central de Drive, interpretado por Ryan Gosling, e até mesmo a Taxi Driver, no qual Travis (Robert De Niro) se aventura pelo submundo de Nova York enquanto trafega pela estrada em sua melancólica função de taxista. E já que estamos falamos do emblemático longa de Martin Scorsese, atentem para o nome da pizzaria em que Baby passa a trabalhar: Goodfellas, aludindo a outro célebre filme do cineasta, intitulado Os Bons Companheiros no Brasil.
A história se desenrola de maneira simples, mas impulsionada pela ação desenfreada, perseguições e fugas alucinantes, diálogos inteligentes e uma trilha sonora fantástica que não desempenha mera função cosmética, como dá o tom à trama. Baby Diver é frenético como as batidas do coração durante uma fuga em alta velocidade ou uma audição de “Brighton Rock” do Queen a qualquer hora do dia.
Andrizy Bento