Dirigido pelo neozelandês Taika Waititi, que se caracteriza pelo humor ácido, sarcástico e autodepreciativo que imprime em seus longas, Thor: Ragnarok, assume sua condição desde a cena inicial. O longa, que é o 17º título a integrar o MCU, muda ligeiramente o tom da franquia instituído até então, mas de maneira bem-vinda. Curiosamente, é o filme que melhor explora o potencial e a mitologia do personagem. Seus predecessores – o mediano Thor de 2011 e o divertido, porém, imemorável Thor: O Mundo Sombrio de 2013 – tiveram, ao menos, o trunfo de estabelecer uma mitologia sólida, embasando o desenvolvimento do universo de Thor no cinema. Asgard, por exemplo, já surge na tela como uma velha conhecida e isso traz um efeito positivo, pois faz com que o espectador receie por seu destino.
Após ser capturado por Surtur em sua busca pelas Joias do Infinito, Thor (Chris Hemsworth) toma conhecimento de que seu pai, Odin (Anthony Hopkins), não está mais em Asgard. Surtur também profetiza que o reino, logo, será destruído por Ragnarok. Assim tem início o filme. Depois de derrotar o demônio em uma sequência dinâmica, engraçada e pirotécnica, Thor parte para Asgard onde se depara com Loki (Tom Hiddleston) se fazendo passar por Odin. Pressionado e ameaçado pelo irmão, Loki acompanha Thor até a Terra na tentativa de descobrir o paradeiro de seu pai. Com o auxílio de Stephen Strange (Benedict Cumberbatch), identificam sua localização na Noruega, onde Odin revela aos filhos que está morrendo e traz à tona a impactante revelação sobre Hela (Cate Blanchett), a sua primogênita, a qual o deus manteve cativa por conta de seu potencial violento e ganancioso. Com a morte de Odin, Hela ressurge, destrói o Mjolnir, o martelo de Thor, e manda ele e Loki para o espaço antes de se dirigir a Asgard, onde começa uma verdadeira sinfonia de caos e destruição, ressuscitando antigos guerreiros que lutaram ao seu lado em um passado distante e massacrando todos aqueles que ficam em seu caminho.
No planeta Sakaar, Thor é capturado pela Coletora 142 (Tessa Thompson), uma caçadora de recompensas que, mais tarde, descobre-se ter uma relação intrínseca com Asgard. Ela o vende para o Grão-Mestre (Jeff Goldblum) para que sirva como um gladiador, haja vista que o hobby do governante local é forçar guerreiros capturados a se confrontarem em uma arena de batalha. No chamado Torneio de Campeões, Thor descobre que terá de enfrentar um velho amigo do trabalho: Hulk (Mark Ruffalo). O desafio do deus do trovão é fazer com que Hulk volte a ser Bruce Banner e possa ajudá-lo a salvar Asgard.
[Abro um parêntese para um serviço de fã: a trama se inspira parcialmente em Planeta Hulk, na qual o grupo de super-heróis Illuminati, na tentativa de se livrar do Gigante Esmeralda, o envia acidentalmente para Sakaar, um planeta bárbaro, corrupto e que não conhece regras. Lá, ele é capturado para se tornar um gladiador. Logo, porém, o herói inicia um levante e derruba o regime vigente].
Thor: Ragnarok aposta em um visual espalhafatoso e uma narrativa burlesca, podendo ser definido como um aventura cósmica colorida e dinâmica, provida de diálogos ágeis e bem humorados. Aliás, o bom humor é o traço mais característico e proeminente do filme. É claro que sobra espaço para a ação. Há diversas lutas acrobáticas e bem coreografadas, das quais a eficiente cinematografia tira muito bom proveito. O longa abraça de vez o universo fantástico pós-Doutor. Estranho e especialmente pós-Guardiões da Galáxia. O grande mérito é não se levar a sério, adotando um clima cartunesco do início ao fim, o que torna o personagem o principal alívio cômico da colossal estrutura que constitui o Universo Cinematográfico da Marvel.
Sim, isso pode até mesmo enfurecer os fãs mais radicais do deus do trovão. No entanto, os elos cada vez mais sólidos com o MCU – o que é constatado pela inserção de outros personagens integrantes desse universo, de suas diversas ramificações, de modo orgânico na trama – é um deleite para os marvetes de plantão. Está cada vez mais visível que todos coexistem e são parte de uma mesma estrutura. Ponto para a Marvel Studios, bem-sucedida em seu projeto iniciado há quase dez anos com o primeiro longa do Homem de Ferro.
A história é conduzida nas telas com leveza, em um ritmo agradável e de modo desacelerado. O desenrolar da trama ocorre sem grandes pretensões, partindo de uma premissa simples, mas com uma execução competente e resultado divertido.
Convém citar a força, carisma e presença de cena de um bom elenco. Todos, sem exceção, parecem se divertir muito ao defender seus respectivos personagens. Destaque para Tom Hiddleston como Loki, Mark Ruffalo, cada vez mais à vontade na pele verde de Hulk e Bruce Banner, além de outros acréscimos bem vindos como a gloriosa e caricata vilã Hela de Cate Blanchett que acerta no tom e na composição de sua personagem; e da caçadora de recompensas interpretada por Tessa Thompson, bastante convincente. O próprio diretor, Waititi, representa Korg – guerreiro do Império Kronan que também dá as caras na saga Planeta Hulk – através da técnica de captura de movimentos. O cineasta empresta a voz e injeta sua aguçada veia humorística ao personagem, arrancando boas risadas do espectador e garantindo alguns dos melhores quotes do filme. Isso sem falar na indispensável participação de Stan Lee.
No mais, é uma boa aventura de fim de semana, descompromissada e que, dificilmente, eleva a franquia e o universo Marvel a um novo patamar como proclamaram críticos mais entusiastas do MCU. No entanto, é recompensador ver como algo que apenas foi ensaiado por Dr. Estranho, sem nunca chegar às vias de fato, finalmente ganha forma neste filme: o tom constante de fantasia sem se poupar de excessos, ainda que aliado à comédia e a ação mais tradicional dos filmes de super-heróis. Ainda assim, sou do time que gostaria de ver a Marvel se arriscar mais, saindo da zona de conforto e realizando mais filmes autorais e de gênero.
Desde que não se cobre muito do personagem e não se exija complexidade e profundidade da trama, Thor: Ragnarok é um bom filme. Longe de ser uma obra prima, mas diverte, empolga e não fere o cânone dos quadrinhos. Também não prepara o público para o grande encontro dos Vingadores no ano que vem, no vindouro Guerra Infinita. É como aquela HQ semanal que vinha sem grandes surpresas nas páginas, mas era diversão suficiente para uma tarde ociosa.
E é mais do que se podia esperar de um filme-pipoca de fim de semana.
★★★
Andrizy Bento
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