Aí está a segunda parte do post em que eu comento os indicados a melhor filme do Oscar 2016. Perdido em Marte, Ponte dos Espiões, O Quarto de Jack e O Regresso sãos as bolas da vez. Lembrando que a cerimônia de entrega da premiação acontece no próximo domingo, dia 28. Até lá, façam suas apostas e não deixem de conferir os posts dedicados ao Oscar aqui no Bloggallerya 😉
Perdido em Marte (Ridley Scott)
★★★½
Outro filme-espetáculo para o currículo de Ridley Scott que, a cada novo longa, parece realmente ficar melhor. Como um bom vinho, o cineasta vem lapidando seu estilo e provando porque é considerado um dos grandes diretores de cinema da atualidade. Perdido em Marte narra a jornada de sobrevivência de um astronauta que, durante uma missão em Marte, foi dado como morto após uma violenta tempestade de areia, obrigando sua tripulação a seguir em frente e, a contragosto, deixá-lo para trás. Sozinho, com recursos que dia após dia vão se esgotando, ele conta com sua engenhosidade e encontra maneiras criativas de tirar o melhor proveito de seus escassos suprimentos de modo a terem maior durabilidade. O astronauta também necessita urgentemente descobrir uma forma de sinalizar à Terra que ainda está vivo. Paralelamente, uma equipe de cientistas trabalha incessantemente junto à NASA em um audacioso plano para trazê-lo de volta. Seus colegas de tripulação também partem em uma missão de resgate, traçando uma rota arriscada pelo espaço exterior em busca do amigo perdido em Marte. Embora cientistas tenham apontado graves erros, afirmando que o longa está repleto de imprecisões científicas, como ficção a obra não apenas se sustenta como é divertida e bem executada. Scott é um ótimo diretor de atores e sabe como conduzir seus personagens em cada um dos espaços em que a narrativa se desenrola. O roteiro cativa a atenção do espectador desde os primeiros minutos de projeção. Não pela inventividade, mas pelo bom desenvolvimento de personagens e da premissa em si que, mesmo não sendo original, é bem trabalhada. Destaque para a direção de arte. O visual é um deleite para os olhos. A montagem é outro item a se destacar, conferindo um ritmo ágil e envolvente à produção. Matt Damon na pele do protagonista, faz um trabalho eficiente como de praxe. O restante do elenco, que traz nomes como Jessica Chastain, Sean Bean, Kate Mara e Jeff Daniels, também mostra boa presença de cena, além de uma ótima química na tela. A trilha sonora, que compreende diversas músicas dançantes dos anos 1970 e Starman de David Bowie – que surge em um momento preci-so do longa e emociona até a mais vil das criaturas – é a cereja no to-po do bolo. Não é uma obra-prima como 2001: Uma Odisséia no Espaço, pode nem estar no mesmo patamar de Gravidade, e nem tem esta intenção. Contudo, é infinitamente superior a Interstellar. Trata-se, por fim, de um blockbuster delicioso, dinâmico e inteligente. Bom seria se todo arrasa-quarteirão fosse assim.
Ponte dos Espiões (Steven Spielberg)
★★★
Steven Spielberg é um bom diretor, isso é inegável. Ele e Ridley Scott são provavelmente os melhores diretores hollywoodianos em atividade atualmente. Em Ponte dos Espiões, trabalho mais recente do cineasta, percebe-se a direção cuidadosa, o zelo na construção de imagens e no desenvolvimento da narrativa, o domínio da mise-em-scène. Porém, o caráter solene e o senso de autoimportância são os fatores que mais incomodam em seus filmes sérios, especialmente os baseados em fatos, como é o caso deste. Tom Hanks, na pele de protagonista para variar, interpreta um advogado especializado em seguros, mas que aceita uma proposta bem distinta de seu trabalho habitual: a de defender um espião soviético (Mark Rylance) captura-do pelos americanos. Lidando com a hostilidade da população que o vê como traidor por defender o inimigo, ele não desiste e parte para Berlim, tornando-se a peça-chave nas negociações entre os Estados Unidos e a União Soviética, para tentar a troca do espião interpretado Rylance por um piloto americano, feito prisioneiro pelos inimigos. As coisas complicam-se quando o advogado toma conhecimento de que um estudante norte-americano tam-bém foi capturado pelos alemães orientais nos primeiros dias da instalação do Muro de Berlim. Dessa forma, tenta negociar a troca do espião soviético por ambos, o piloto e o estudante, em uma estratégia arriscada e que tem tudo para ser mal-sucedida. A recons-tituição da época é fidedigna. Ponto para o o trabalho de cinematografia que, aliado a um desenho de produção bem cuidado, corroboram um clima acertado de Guerra Fria. Artisticamente não há graves equívocos a serem apontados. Contudo, os maneirismos de Spielberg estão sempre presentes, como a trilha sonora incidental bonita, mas que intenta trazer uma aura de imponência a cada cena, e que acaba por se tornar frívola. O diretor também erra a mão, costumeiramente, quando retrata a figura do herói americano diplomático, o homem bom e íntegro, fiel aos seus princípios. Não ajuda o fato de Tom Hanks interpretar o americano virtuoso que parece traduzir o conceito de heroísmo – algo que vimos também em O Resgate do Soldado Ryan. Falando em cast, Rylance chega a ser enfadonho na interpretação do espião soviético. Vencedor de vários prêmios e apontado como um dos favoritos ao Oscar de ator coadjuvante, sua atuação é competente, mas, à certa altura, seu tom monótono causa cansaço no espectador. Há, pelo menos, uma cena que é realmente emblemática e interessante no longa: quando o personagem de Tom Hanks observa, do metrô, crianças saltando uma grade em Nova York, em contraste com a cena que ele presenciou na Alemanha, de pessoas tentando ultrapassar o muro de Berlim e sendo alvos de extrema violência. Há melancolia em seu olhar, como se ponderasse acerca da liberdade e o quão frágil ela pode ser. De resto, ele apela para clichês narrativos e visuais em profusão, com um grau de sentimentalismo elevado que prejudica sua obra, o que não se trata de uma novidade na filmografia do cineasta. O tom de suspense (ainda que discreto) que poderia ser mais bem trabalhado e construir uma trama envolvente, se esvazia devido à alta carga de melodrama. Trata-se de outro drama histórico extrema-mente spielbergiano, o que não chega a ser um demérito, tampouco é um elogio de fato.
O Quarto de Jack (Lenny Abrahamson)
★★½
A intenção de Lenny Abrahamson era das melhores, e é possível perceber isso nos primeiros minutos de projeção. Mas o realizador parece patinar no gelo fino, tentando demonstrar segurança na condução de sua trama, escapar da abordagem da barbárie da ação, mostrando-a por uma lente ingênua que são os olhos de Jack, uma criança, vítima de um crime, mas totalmente ignorante desse fato. O resultado: Abrahamson escorrega e transforma uma história que envolve sequestro e estupro em uma narrativa infantilizada e pueril. Jack, o garotinho do título, interpretado pelo cativante Jacob Tremblay, tem uma vida incomum, embora sequer suspeite disso. Inocente, ingênuo e curioso como qualquer outra criança de sua idade, ele vive em um espaço de 10m² ao lado de sua mãe, a provável vencedora do Oscar de melhor atriz, Brie Larson. Ela se dedica a manter o filho seguro, contando histórias e inventado brincadeiras de modo a protegê-lo da cruel realidade em que vivem. Bastam alguns minutos para descobrirmos que ela foi sequestrada e o filho é fruto de um estupro. Ambos são mantidos em um cativeiro que o sequestrador visita regularmente, trazendo suprimentos e abusando sexualmente da mãe de Jack, enquanto o garotinho fica escondido dentro do armário conforme orientado por ela. Tudo o que a mãe de Jack quer é que o sequestrador não se aproxime de seu filho. Não suportando mais a situação em que vivem, ela traça um plano de fuga e precisa da ajuda de Jack para que alcancem a liberdade. Talvez o único mérito do longa é tentar imprimir delicadeza em uma narrativa que tinha tudo para ser pesada e fortemente depressiva. Não que o filme não seja melancólico, mas a presença de Tremblay traz cor e luminosidade à uma trama cinzenta. De resto, acaba por se render a vários chavões típicos de melodramas. É uma história sobre se reajustar e readaptar a uma nova realidade, o que poderia ser interessante, mas é falho na abordagem visual e narrativa. Uma boa cena é quando o garotinho vê o mundo pela primeira vez, chegando bem próxima de emocionar de maneira genuína. Mas O Quarto de Jack limita-se a ser simplista, focado no relacionamento entre mãe e filho, no clichê da força do amor familiar, relativizando o crime em si, que acaba mal resolvido. Aliás há uma série de situações mal resolvidas na trama. Uma delas é a rejeição que Jack sofre de seu avô materno. Falta profundidade e um senso maior de propósito. O longa acaba tão preso ao olhar da criança, que se torna demasiado infantil e desprovido de escopo.
O Regresso (Alejandro Gonzáles Iñárritu)
★★
Para início de conversa, é necessário dizer que você não precisa ver O Regresso em um templo. Pode ver no cinema mesmo. Mas é bom se preparar para mais de duas horas de um longa pretensioso e arrastado. O Regresso é uma história de vingança e redenção. E com um final tão previsível quanto boa parte das histórias que versam acerca destes temas combinados. Leonardo DiCaprio interpreta um lendário explorador que, durante uma expedição pelo deserto americano é atacado por um urso. Deixado para trás pela maior parte de sua equipe de caça, apenas dois membros continuam ao seu lado, por obrigação e não por solidariedade. Quase à beira da morte, tentando resistir à dor, ele é traído por um de seus próprios companheiros, papel desempenhado por Tom Hardy. Contra todas as expectativas, ele atravessa um terrível inverno guiado pela coragem e pelo seu instinto de sobrevivência, em busca de vingança e redenção. Comparações com Dança com Lobos, vencedor do Oscar de melhor filme em 1991, surgem eventualmente. Porém, este é inferior ao filme de Kevin Costner. E isso vem de alguém que nunca viu grande coisa em Dança com Lobos. O Regresso se propõe a ser esteticamente bonito. Mesmo que a câmera filme tão especificamente lutas sangrentas, vísceras, pele, sangue sem pudores, os frames são belos e cheios de lirismo. Portanto, a violência não é crua e nem chega a impactar. Emmanuel Lubezki – colaborador de Iñárritu no filme anterior do cineasta, Birdman, e um dos melhores diretores de fotografia da atualidade, ao lado de Darius Khondji e Robert Elswit, erra a mão desta vez e peca pelo excesso, compondo uma fotografia contemplativa demais. O uso excessivo e contínuo de lentes grande angulares e panorâmicas chega a ser incômodo e cansativo. A paleta de cores, contudo, é eficiente, tornando os cenários agradáveis a despeito dos movimentos exagerados de câmera e dos longos e pomposos planos. Nesse quesito, o design de produção realmente merece algum alarde. A soberba de Iñárritu é visível em cada fotograma. Não é à toa que ele tenha se convencido da ideia de que o filme merece ser visto em um templo. Mas não. Tirando toda a perfumaria e suntuosidade, a trama não apresenta nada de novo, partindo de uma premissa bastante convencional e se desenvolvendo tal qual. Boas atuações, mas nada espetaculares, nada que realmente justifique a indicação de Tom Hardy como coadjuvante e nem mesmo uma vitória para Leo DiCaprio. Ele já esteve melhor, como por exemplo em O Lobo de Wall Street e até mesmo em O Aviador. Entretanto, deve levar pelo conjunto da obra. Para alguma coisa, pelo menos, o filme do templo serviu.
Andrizy Bento
3 comentários em “Oscar 2016: Indicados a Melhor Filme – Parte 2”